sábado, 21 de março de 2009

Escolas de jornalismo não ensinam oratória

Um dos maiores filósofos inglês durante o período da Renascença, Francis Bacon, afirmava que o homem completo apresenta três elementos distintos:
O homem que escreve é exato
O homem que lê é cheio
O homem que fala é pronto
Escolas de jornalismo, na sua maioria, não contemplam uma disciplina de oratória. No terceiro milênio cristão da história da humanidade, falar em público ainda é considerada uma arte que se deve aprender empiricamente, apesar de toda a ciência que fundamenta o ato. Na comunicação oral, apenas 7% se faz pelo significado das palavras. Entonação de voz, modulação, velocidade, volume, ou seja, como se fala comunica 38%. Os 55% restantes (a maioria) é o corpo que fala: gestos, posturas, vestuário, semblante etc. Estes dados disseminados principalmente por neurolingüistas revelam o descaso da academia com a comunicação humana.
Praticamente todo o esforço escolar é para ensinar signos, seus significados e significantes. Em seu livro “Pragmática da Cognição – A textualidade pela relevância”, Jane Rita Caetano da Silveira e Heloísa Pedroso de Moraes Feltes (EDIPUCRS, 1997) abordam as inferências nos enunciados e alertam: “Um mesmo enunciado pode ser diferentemente interpretado quando variam as situações comunicativas em que este se inscreve”. A psicologia explica que nenhum ser humano é emocionalmente igual a outro, pois nossas personalidades se formam com base em subjetividades privatizadas em contextos únicos.
Samira Chalub em “Funções da Linguagem” (Editora Ática) afirma que “todos os sistemas de sinais são passíveis de interpretação metalingüística”. Então, sobre uma mesma palavra, dita com um sorriso, tem-se, de um determinado ouvinte, a possibilidade de interpretação completamente diferente se expressa com um semblante tenso, por exemplo. Como se vê, tem razão um dos mais brilhantes comunicólogos da atualidade no país, Dr. Jacques Weinberg: “Quando duas pessoas conseguem se comunicar, é preciso comemorar”.
Em “Lingüística e Comunicação” (São Paulo, Cultrix, 1969), Roman Jakobson lembra: “O empenho em iniciar e manter a comunicação é típico das aves falantes; dessarte (sic), a função fática da linguagem é a única que partilham os seres humanos. É também a primeira função verbal que as crianças adquirem; elas têm tendência a comunicar-se antes de serem capazes de ouvir ou receber comunicação informativa”.
Para se tornar um bom emissor (comunicador, orador, repórter etc) é necessário ter bem definido:
O que falar?
Quanto falar?
Quando falar?
Como falar?
Quando calar?
É imperativo que um comunicador tenha dotes quanto:
- À inteligência, com habilidades para a Argúcia (facilidade para penetrar nos problemas que lhe são propostos);
- Imaginação (facilidade para torná-los concretos) Memória (capacidade para reter os argumentos e o fio do discurso);
- À vontade, composta por Sensibilidade (capacidade de se sintonizar com os sentimentos dos ouvintes);
-Paixão (capacidade para entusiasmar-se com as próprias idéias) e Energia (capacidade de impor a sua vontade aos ouvintes);
- Ao físico, destacadamente para o Aspecto (nobre para se impor – natural);
- Voz (agradável, forte, sonora, maleável, clara, para se fazer compreender) e
- Gesto (fácil, elegante, natural para agradar).
A comunicação verbal é uma “arte” que requer muitas qualidades numa sociedade que tem na televisão o principal veículo de informação, e que Pedro Maciel, em seu livro “Jornalismo de Televisão (Sagra – D.C. Luzzato Editores, RS, 1995) alerta: “O jornalista, na maioria das escolas, ainda continua recebendo uma formação profissional como se fosse trabalhar apenas em jornal impresso e quando vai para a televisão, de um modo geral, mostra muita dificuldade para falar a linguagem do telespectador...”
Ensina ainda o escritor: “O repórter de televisão precisa preocupar-se também em manter cuidados com a roupa, que deve ser bem cortada e de bom gosto, com o cabelo, que deve passar uma impressão de limpeza e harmonia, com a voz, que deve mostrar segurança na televisão, esses cuidados deixam de ser expressão de futilidade, sinais de vaidade pessoal, para se tornar uma necessidade profissional”.
Tão indiscutível quanto é a premissa de que o homem não vive socialmente sem comunicação, deveria ser a necessidade das escolas que formam comunicadores de investirem científica e insistentemente na oralidade humana. Considerando que a comunicação representa a condição da possibilidade da interação social, visa em essência a satisfazer a necessidade de cooperação que se desenvolve na sociedade. A linguagem surge em resposta a esta necessidade, constitui o produto da comunicação.
Para Francisco R. Rüdiger (Comunicação e Teoria Social Moderna – Introdução aos Fundamentos Conceituais da Publiscística. Editora Fênix, 1995), “a linguagem é uma criação coletiva em que se materializam as formas de consciência socializadas pela comunicação, alimentando a consciência individual e fornecendo a matéria de seu desenvolvimento”. É de se espantar que diante de tantas evidências e complexidades pouca atenção se dá ao tema nas escolas.
Enquanto um orador do cotidiano enfrenta platéias de dezenas ou algumas poucas centenas de ouvintes, o repórter, jornalista ou apresentador de televisão “conversa” com milhares, milhões. Suas dificuldades aumentam, pois ele não vê sua platéia que o fixa atenta e detalhadamente. Superar o medo de falar em público não é tarefa simples, em se tratando de profissionais de comunicação, pois ele sabe que a platéia está ali e ele não a vê. Enquanto o orador de platéias vê e interage com o “perigo”, o profissional da comunicação o tem potencializado, por ser o “perigo” invisível.
Jornalistas são seres humanos, apesar de alguns se acharem o contrário, e uma pesquisa feita no início deste milênio pelo jornal inglês Sunday Times com três mil americanos revelou dados surpreendentes. A pergunta era: qual o seu pior medo? As respostas:
41% disseram que era falar em público;
32% têm mais medo de altura;
22% de insetos;
22% de ter problemas financeiros;
19% de doença;
19% da morte.
Outra pesquisa realizada com 100 mil australianos mostra que 1/3 dos entrevistados diz preferir a morte a falar em público. Em qualquer lista de medos, o medo do público geralmente aparece em primeiro, na frente até da morte. O medo de falar em público é, na verdade, uma soma de vários medos:
- o medo de falhar ou de fazer uma apresentação pobre;
- o medo da platéia, pois a vemos com uma autoridade julgadora;
- o medo do material
É fato que a “arte” de falar, polemizar, conversar e discursar permite revelar o caráter, temperamento, cultura e grau de educação do orador. O medo de falar em público impede que algumas pessoas consigam fazer uma boa apresentação. O Clube de Oratória e Liderança de Joinville (www.clubedeoratoria.org.br) divulga os dez maiores medos:
1) De falar em público;
2) De altura;
3) De insetos e vermes;
4) De problemas financeiros;
5) De águas profundas;
6) De doenças;
7) Da morte;
8) De voar;
9) Da solidão;
10) De cachorro
O medo do desconhecido, inerente da natureza humana, é outro vilão. Enfrentar platéias e não ter domínio sobre suas reações assustam tanto quanto o medo da opinião pública sobre sua reportagem ou apresentação. A maioria das pessoas é muito autocrítica e teme o ridículo. Identificar o medo e enfrentá-lo são as melhores formas de impedir que ele atrapalhe o seu desenvolvimento profissional. Como é que um projeto pode ser aprovado se você estiver tremendo nas bases na hora de apresentá-lo?
Entre executivos brasileiros, pesquisa da revista Você S.A. apontou:
- 64% de 481 leitores que responderam dizem ter medo de falar em público.
- 66% de 261 assumem que esse é um de seus maiores medos.
Duas notícias para você. A má: vencer esse medo é fundamental para você ter chance de sucesso. A boa: é possível dominar esse medo e até fazê-lo trabalhar em seu favor. "Não existe nada realmente especial em falar em público. Não é um dom genético herdado nem está sujeito à inspiração divina. É um ofício que se aprende, exatamente como se aprende o ofício de marceneiro, de esquiador, de saxofonista", afirma o americano Jack Valenti em seu livro A Fácil Arte de Falar em Público.
O circuito completo das comunicações verbais se compõe de seis partes:
1) Fonte e ou emissor humano
2) Voz
3) Vocabulário
4) Expressão corporal
5) Decodificadores
6) Retorno
Enquanto a voz comunica mensagem emocional, temperamental e psicológica, carregando com facilidade a personalidade, o vocabulário leva a mensagem intelectual. Constitui-se de sinônimos, antônimos e analógicos ou palavras afins. A expressão corporal (mímica) pode fortalecer ou enfraquecer e até destruir a comunicação da voz e do vocabulário, pois como já vimos, o corpo comunica mais da metade da mensagem.
Os decodificadores, receptores ou ouvintes, receberão a comunicação de maneira fidedigna se não houver interferência, ruído. Já o retorno, ou feedback, é a realimentação para que o comunicador possa receber e aproveitar as influências do ouvinte ou de um auditório para manter o discurso ou mudá-lo.
Os gregos (da Grécia antiga) pregavam que era muito mais vergonhoso um indivíduo não saber lutar com sua comunicação verbal do que não saber lutar com sua força física, pois a força física era fruto da mãe natureza e a capacitação para a linguagem oral dependia única e exclusivamente da vontade de cada um.Escolas de comunicação precisam atentar para o ensinamento de outro grande orador, Sócrates, que dizia: “Fala para que eu te veja”.
Altamir A. Andrade é jornalista, professor e personal trainer de oratória, Instrutor Titular e Conselheiro do Clube de Oratória e Liderança de Joinville

Nenhum comentário:

Postar um comentário